sexta-feira, 24 de abril de 2015

Liberdade

Sobre esta página escrevo
teu nome que no peito trago escrito
laranja verde limão
amargo e doce o teu nome.

Sobre esta página escrevo
o teu nome de muitos nomes feito água e fogo lenha vento
primavera pátria exílio.

Teu nome onde exilado habito e canto mais do que nome: navio
onde já fui marinheiro
naufragado no teu nome.

Sobre esta página escrevo o teu nome: tempestade.
E mais do que nome: sangue. Amor e morte. Navio.

Esta chama ateada no meu peito
por quem morro por quem vivo   este nome rosa e cardo
por quem livre sou cativo.

Sobre esta página escrevo o
teu nome: Liberdade.


Manuel Alegre, in A Praça da Canção

2 comentários:

Anónimo disse...

Obrigado por nos trazer um tão lindo poema para lembrar uma data que foi um imenso e coletivo grito de júbilo.Hoje Abril esmoreceu. Para alguns ele tem um significado vazio ou superficial. Tendo vivido sempre no período depois dele não conheceram os tempos anteriores,tempos difíceis, com uma acentuada divisão de classes,com a educação aberta apenas a alguns, com muito ouro no Banco de Portugal , mas muita miséria derramada pelas cidades ,vilas e aldeias portuguesas.
Onde estamos hoje? Parecemos caminhar para uma pobreza maior, um vazio cultural,um esvaziamento de cofres, mas sobretudo de pessoas, de novo roubadas naquilo que as deveria orgulhar - serem livres, terem voz, entenderem o que lhes é "vendido" para poderem ,criticamente, decidir. Terem voz!
Não, não há liberdade se falta o pão,se falta a saúde, se se é enganado com palavras ocas, quando não mentirosas . Não basta ter uma escola e um centro de saúde para se ter direito à saúde e educação. É preciso que os serviços que aí são fornecidos sejam de qualidade. Cada vez mais esta é uma verdade mais pálida, mais débil, mais enganadora. E cresceu de novo o medo, sim o medo, palpável, como um podre que se instala enquanto andamos distraídos...
Se hoje temos que ser servos para termos pão , se um tempo de silêncios se nos impõe porque pão é preciso, que ao menos não morra dentro de nós a chama de chegar mais alto e mais além, de ser Homem, livre e digno!
Que Abril se cumpra um dia!

Anónimo disse...

As Portas que Abril abriu

«Era uma vez um país
onde entre o mar e a guerra
vivia o mais infeliz
dos povos à beira-terra.
(...)
Era uma vez um país
de tal maneira explorado
pelos consórcios fabris
pelo mando acumulado
pelas ideias nazis
pelo dinheiro estragado
pelo dobrar da cerviz
pelo trabalho amarrado
que até hoje já se diz
que nos tempo do passado
se chamava esse país
Portugal suicidado.
(...)
Foi então que Abril abriu
as portas da claridade
e a nossa gente invadiu
a sua própria cidade.
Disse a primeira palavra
na madrugada serena
um poeta que cantava
o povo é quem mais ordena.
(...)
Foi esta força viril
de antes de quebrar que torcer
que em vinte e cinco de Abril
fez Portugal renascer.
E em Lisboa capital
dos novos mestres de Avizinha
o povo de Portugal
deu o poder a quem quis.»

in SANTOS, Ary dos.- As Portas que Abril Abriu. Lisboa, 1975.